quarta-feira, 11 de maio de 2011

No fim da alameda - Maria Helena Balen

No fim da alameda
vejo uma luz
(ou sinto?)
Me debato,
me arrasto
me arrisco
para chegar
onde me esperam
braços
que me abraçam,
me aninham
e perguntam
em doce acalanto:
Por quê?
Por que demoraste tanto?

terça-feira, 10 de maio de 2011

Procurei nos meus guardados e, encontrei este recorte. Um recado para os que estão planejando tentar o ofício.

“...Porque é verdade. Mas não penses que te censuro. Se queres transformar-te num homem de letras, e quem sabe um dia escrever Histórias, deves também mentir, e inventar histórias, pois senão a tua História ficaria monótona. Mas terás que fazê-lo com moderação. O mundo condena os mentirosos que só sabem mentir, até mesmo sobre coisas mínimas, e premia os poetas que mentem apenas sobre coisas grandiosas.” De Humberto Eco, Baudolino

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Tomates Secos - Marilia Galvão



Faz tempo que venho pensando em contar para o mundo como se faz tomates secos em casa. Ficam divinos. Depois que você os fizer e dividir com quem ama, não mais poderá parar, tal a emoção não só de quem faz como a de quem recebe.
Comigo, tudo começou no boca a boca de meu genro Luciano, excelente cozinheiro e gourmet, o que deu maior credibilidade ao feito. Após prová-los e, eventualmente, ser presenteado com os referidos, iniciou uma campanha. Dissuadir os amigos, quando reunidos para jantar fora, de escolher pratos com tomates secos na composição. A justificativa – Bons só os que a sogra faz.
Acredito que o sucesso dos – meus tomates secos – esteja no resultado de uma alquimia, uma mudança meio mágica. Eu, enquanto administro esse processo, sinto-me um pouco bruxa, o olhar constante no processo artesanal. No pensamento a visão do sorriso nos rostos dos felizardos que os comerão.
Antes de tomar conhecimento da receita, quero lembrar ao leitor a importância do planejamento e os cuidados com os detalhes, a começar pelas providências dos ingredientes e utensílios.
Tempo e paciência também são requisitos necessários. Lembre-se: a pressa é inimiga da perfeição. Os tomates se chamam de secos, porque são desidratados em fogo baixo, por um tempo aproximado de quatro horas.
Os Ingredientes: -3 kg de tomates maduros, porém firmes;- 5 colheres de sopa de açúcar;- 2 colheres de sopa de sal;- temperos a gosto: alho picado, orégano, louro;- azeite ( para cobri-los depois).
O Modo de Fazer em quatro etapas :1ª – Misture o açúcar com o sal e reserve. Corte os tomates ao meio. Retire a parte interna e as sementes. Arrume-os com a parte côncava para cima em assadeiras. Polvilhe-os com a mistura de açúcar e sal. Forno em 180º por 45 min.
Na 2ª – Retire do forno, escorra a água que se soltou dos tomates, coloque-os de volta. Temperatura 180º - 45 min.
Nesta terceira fase, eles já estarão secando. Ponha-os com a parte côncava para baixo. Temperatura – 150º - 45 min.
Para finalizar, última etapa. Vire-os novamente, coloque sobre cada tomate: alho picado, orégano e um fio de azeite. Temperatura- 150º - 45 min.
Após esfriarem, arrume-os dentro de vidros esterilizados, com uma opcional folha de louro e cubra-os com um bom azeite.
O resultado surpreende pelo sabor e pelo visual. Uma transformação. Pela lentidão com que é feito, o tomate, ao ficar seco, libera o que se chama de precursores do sabor. Intenso é a palavra.
Há inúmeras sugestões culinárias para o uso da iguaria, a seguir deixo uma que considero simples e perfeita para qualquer ocasião, além do mais, parece uma poesia : Brie, figo e tomate seco em leito de alface.
Em um leito de alface vermelha e verde, crespa e lisa,
Deitar lâminas de queijo brie junto a fatias de figo maduro
E pedaços de tomate seco.
Com essa salada, um prato de massa e um copo de bom vinho, acabam-se todos os problemas do mundo. E, se lá fora estiver chovendo, que dia lindo!

De uma certa janela - Marilia Galvão

Afasto as cortinas e olho para a rua. É de manhã cedo. Faz frio. Vejo as pessoas apressadas indo ao trabalho. Algumas esperam o ônibus, outras somem na entrada do metrô.
Da janela do meu quarto no hotel, quatrocentos e quatro, no quarto andar, me encanto com as calçadas molhadas pela chuva da madrugada. Elas refletem as cores dos luminosos das lojas e cafés. Isso porque o dia ainda não clareou de todo.
Por ser inverno, os plátanos da avenida estão sem as folhas. Posso, por entre seus galhos, passear meus olhos em todas as direções.
Baixo meu olhar, vejo a banca de jornais na calçada, o toldo do Indiana Club, o café da esquina e a escada de acesso ao metrô, por onde tenho entrado e saído nesses dias.
Percebo que a floricultura da outra esquina já abriu. Um espetáculo de perfume e cor no cinza do dia. Aliás, agora tudo está aberto, funcionando. Ah! Até aquela loja de doces, chocolates, tortas, licores, vinhos e champagnes. Que delícia!
Agora o dia está claro. Ainda cinza, mas claro. Mais pessoas vão e vêm. Continuo apenas parada em frente à janela, meu olhar continua vagando.
Do outro lado da rua, a loja Darty destaca-se no centro comercial. Bem na minha frente há um prédio enorme, revestido de granito. Até onde a vista alcança há outros prédios com lojas comerciais no térreo. Farmácia, papelaria, café, restaurante, loja de móveis vintage. E, oh!, uma loja de perfumes no subsolo que dá de brinde, conforme o valor da compra – écharpes de seda. Ainda hoje passo lá.
Presto atenção em uma cena que ocorre em meu campo de visão. Uma jovem, cabelos castanhos compridos, mochila nas costas, pega uma das bicicletas disponíveis no estacionamento próprio e pedala até a sinaleira. Seus cabelos esvoaçam ao vento cortante. Quanto ela vai agüentar? De repente, antes de o sinal abrir, ela devolve a bicicleta e vê o ônibus. Vai, vai que dá!
Outra cena acontece em seguida. Atrás do ônibus em que a moça entrou, um automóvel para, o motorista desce e aguarda por uma senhora elegante, de casaco de peles e salto alto, que vinha com passos rápidos do edifício, aquele do granito. Ele lhe entrega as chaves, ela toma o lugar dele. O ônibus arranca, o carro também. As duas mulheres se vão.
Não acontece mais nada que me chame atenção. Mas fico pensando. Me vi nas duas. Na menina que corre atrás dos sonhos, que estuda e fará escolhas. Na mulher que já escreveu seu caminho, mas ainda quer mais.
Fecho a janela, estou sorrindo.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Dos Lugares às Emoções - Liane Maria Rech

Quando clico na caixa de minha memória, os arquivos de viagens baixam, e eu volto no tempo. Fiz um passeio de helicóptero, sobrevoando um imenso e íngreme desfiladeiro de rochas multicoloridas. Elas foram desgastadas pelo Rio Colorado, há milhões de anos. Este é um lugar que me deixou surpresa e maravilhada. Surpresa pelo tamanho imenso da erosão que o rio provocou e maravilhada pela paisagem que resultou de tal erosão: o <"i">Grand Canyon. Diante dele, me senti reduzida ao tamanho do grão de arroz. Do diminuto grão de arroz, passei ao tamanho do King Kong. Isso porque já me transferi para o topo do majestoso Empire State, de onde tenho a capital do mundo a meus pés. Os arranha-céus tomam conta das alturas. A vista do por do sol, do acender das luzes é inesquecível. Cidade palco dos mega show internacionais, das grifes, cenário de filmes. Cidade cosmopolita. Nova Iorque é tudo de bom. De uma altura a outra, vou para a Torre Eiffel. Emoção extenuante! Contemplar, de cima, o esplendor da arquitetura de Paris é presente dos deuses. Palavras? Desnecessárias. Por mais que tente, seriam insuficientes para expressar toda a emoção sentida diante de tal beleza singular. Fui contemplada, novamente, com a beleza do por do sol e acender das luzes. Paris dos artistas, dos pintores, dos poetas, dos escritores, é a capital da cultura. Paris é Cidade Luz. Estou com o som ligado. A música: Que c´est Triste Venise. Parece o suspiro de alguém que perdeu seu grande amor. Ah! Veneza, cidade flutuante, cercada pelo mar Adriático. É puro charme. Romântica. Cenários dos grandes amores. Transpira emoções. Seus canais e pontes, os cristais de murano são suas características marcantes. Na Piazza San Marco, quando cheguei de manhã, ouvi O Anônimo Veneziano, do filme que leva o mesmo nome e se passou na própria cidade. Senti emoção só com a música. Não imaginava as surpresas que me aguardavam. Nessa praça, com a Catedral, o campanário, as pomba restaurantes com música ao vivo, a parada é obrigatória. O passeio de vaporeto pelos canais e pontes me deu visão ampla da cidade. Pude, então, admirar sua beleza ímpar com maior deleite. O outro passeio que fiz foi uma aventura a pé. Andei e andei sem rumo pelas ruelas pitorescas, por entre os casarios medievais, que fazem respirar sua própria história. Caminhei tanto, que acabei me perdendo. E aí? Utilizei-me do meu mísero dialeto e solicitei informações. Não é que me entenderam? Que prazer, perdida em outro país, falar outro idioma e ser compreendida. E o passeio de gôndola à noite? No céu, as estrelas que brilhavam e uma enorme Lua Cheia que iluminava o cenário... Propício para l’ amore. Outra gôndola nos acompanhava e, com ela, o cantor que nos presenteou com a canção O Sole Mio. Nesse momento, estávamos passando pela Ponte dos Suspiros. O coração queria saltar do peito, tamanha a emoção. Minha memória gravou essa passagem por Veneza, armazenou e não deletou mais. Quando me perguntam qual a melhor lembrança de viagem, sempre respondo que são muitas. No entanto, meu pensamento vai direto para esse passeio noturno de gôndola em Veneza com a Lua Cheia. Será que meu sangue latino pensa mais alto também?

A Primeira Vez que Vi Paris - Marília Galvão


Sempre quis conhecer Paris. Desde jovem. Um amigo me disse – mas ainda és jovem, só que há mais tempo. Pois na maturidade, fui a Paris. Essa cidade invadiu meu ser pelos cinco sentidos. Não tive medo de ser feliz. Vivi momentos gloriosos, inesquecíveis. Agora, com uma única palavra eu a defino – Surpreendente!
Estive lá em janeiro. Mesmo no inverno, com as árvores secas, o céu cinza, alguns flocos de neve e gelo no chão, você vai se deslumbrar com a paisagem da cidade e a agitação dos parisienses. O charme e a sofisticação estão em todos ambientes aonde você for. Aquecidos, por certo.
Paris conta história na arquitetura, nos museus, nas igrejas e avenidas, nos parques, teatros, até nos cemitérios. Lá tudo transpira arte, cultura, beleza, harmonia.
Estando lá, faça o lado clássico do programa. Suba na Tour Eiffel também ao entardecer, quando as luzes da cidade se acendem. Visite os museus. Há tantos. O Louvre impressiona pelo tamanho, pela arquitetura e pelo acervo de obras. O maior do mundo. Consulte o mapa e selecione o que você acha mais importante, a não ser que você tenha uma semana disponível tão somente para isso.
Gostei, em especial, do Musée d’Orsay. Trata-se de uma antiga estação de trem, transformada em lar dos impressionistas. Admirar telas de Monet , Renoir e outros me deixou extasiada. Puxa vida, eu estava diante das obras feitas por eles. Que vontade de vê-las também com as mãos! Claro que um segurança me impediria. Mãos nos bolsos.
Outro museu merecedor de uma visita é o Musée Cluny. Situado no Quartier Latin, construído em 1500, guarda tesouros misteriosos, armaduras, objetos, trajes e jóias dessa época. Expõe tapeçarias enormes, estilo millefleurs – muitas flores, animais e pessoas em cenas do dia a dia - descobertas no século XIX. A personagem central das tapeçarias é La Dame à La Licorne, cuja identidade é desconhecida, o que fascina o público e desafia a imaginação dos especialistas.
No Palais de Versailles também não se pode deixar de ir. Bosques, jardins, fontes, Le Grand e Le Petit Trianon. Você estará nos ambientes em que os reis da França viveram: Luís XIV, Luís XV, Luís XVI. Ah, e a Rainha Maria Antonieta.
Em Paris tudo é superlativo. Prepare-se para caminhar muito. Com esse pensamento, adentre pelas dependências do Musée de L’Armée e Hôtel des Invalides, primeiro foi quartel, depois hospital para as centenas de soldados feridos nas guerras. Na Igreja estão os restos mortais de Napoleão Bonaparte. Ali pertinho, caminhe pelas margens do Sena, pelo Jardin des Tuilleries, arredores de l’Arc de Triomphe e pela avenida mais charmosa do mundo - a Champs-Élysées. Se puder por ela andar tarde da noite, quando deserta, você entenderá o porquê de tanta magia.
Cada arrondissement de Paris tem encantos próprios. Um deles, o Marais, dos mais antigos, com suas ruas estreitas e a Place des Voges, prédios medievais, galerias de arte, lojas chiques e cafés convida para ficar. Montmartre é outro que, pelas características, quase me deixou sem fôlego. Não por subir suas ladeiras, mas pelo espetáculo que é ver Paris do alto da Basílica de Sacré Coeur, inclusive a igreja, muito linda. Ali pertinho, em frente à Place du Tertre, há um restaurante legal chamado Au Clairon des Chausseurs. Ali provei e amei os tais escargots. Montmartre é a colina dos artistas. Ao descer, na volta, pela Rue Lépic, onde Van Gogh morou, você vai dar em Pigalle, e verá o Moulin Rouge, cabaré criado em 1889, imortalizado nas telas de Toulouse Lautrec.
Tive a impressão de que Paris é uma cidade e muitas. Creio que tudo o que há de bonito está lá, tudo deve ser visto, a Igreja Notre Dame, o Panthéon, o Ópera Nacional Palais de Garnier. Tudo dá arrepios. O Sena, as pontes e os prédios próximos às margens. O que pulsa nas ruas, a imagem do homem com o realejo, o tocador de sax, os saltimbancos da Place de La Bastille, as crianças sentadas ao redor da escultura O Beijo, de Rodin, ouvindo a explicação da professora, os parisienses lendo no metrô...
Por falar neles, utilize a regra: os melhores restaurantes e cafés são os freqüentados pelos parisienses. Pode-se comer bem em qualquer parte de Paris. Restaurantes, bistrôs ou brasseries são atrativos, pitorescos, aconchegantes. Os cardápios estão expostos pelo lado de fora com os preços. É tradição servirem, junto com a refeição, pain e moutarde. Isso não é cobrado, nem a carafe d’eau que você pedir. Os vinhos são ótimos.
Recomendo como imperdível um dos restaurantes mais conhecidos de Paris – La Coupole, no Boulevard de Montparnasse inaugurado em 1927. Além do cardápio rico, a decoração é Art Nouveau, com pinturas de artistas da época. Lembre-se, quando entrar, de pensar em Picasso, Hemingway, Sartre, Gainsbourg, Jane Birkin...
Quanto aos cafés, são muito românticos.
Paris me fisgou também pelos detalhes. E que detalhes! Como não ver a iluminação, os lampiões, as cabines telefônicas e as bancas de jornais, as grades do chão ao redor das árvores, vitrines, fachadas, portas, janelas, entradas de metrô remanescentes da Belle Époque, os carrossseis...
Na Cidade Luz até o que é contemporâneo ou futurista convive em harmonia com a Paris tradicional - obras polêmicas e belas – a Torre Eiffel, a pirâmide de vidro do Louvre, a Torre de Montparnasse, o Bairro La Défense com prédios altos e modernos, o Centre Pompidou, museu de arte moderna com estruturas aparentes.
A primeira vez que vi Paris não será a última. Ainda ficou muito por descobrir e rever. Alguém me perguntou sobre o que eu mais gostei. Difícil responder. Lá tudo é único. Acredito que o melhor de Paris pode ser desvendado por conta própria, por cada um.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Guardados - Leonor Bassani

Procurei nos meus guardados e, encontrei este recorte. Um recado para os que estão planejando tentar o ofício.

“...Porque é verdade. Mas não penses que te censuro. Se queres transformar-te num homem de letras, e quem sabe um dia escrever Histórias, deves também mentir, e inventar histórias, pois senão a tua História ficaria monótona. Mas terás que fazê-lo com moderação. O mundo condena os mentirosos que só sabem mentir, até mesmo sobre coisas mínimas, e premia os poetas que mentem apenas sobre coisas grandiosas.” De Humberto Eco, Baudolino

Formiguês - helena dossin


Sexta à tardinha, hora de refrescar as dracenas, os gerânios e as suculentas. Exito diante do regador cheio de água: chuvisco ou não chuvisco? Uma trilha de formigas atravessa a floreira. Vestem marrom. Cintura fina – elegante! Bumbum avantajado – sexy! Carregam retalhos de folhas verdes, recortadas em tamanhos diversos, que formam imagens das fases da lua. Há também o molde de um ursinho, um sorvete e um navio. Evidente: são operárias. Uma delas, corajosa ou exibicionista, tenta equilibrar uma folha inteira. Tomba de um lado, tomba de outro, mas não desiste. Pelo formato e serrilhado na borda, suponho que a folha seja de roseira,

Hum! As formigas vem do andar de cima, costeando a parede. A vizinha da testa franzida só planta arruda, comigo-ninguém-pode e – rosas! Ela não vai gostar nada de nada de ver suas roseiras depenadas, ou melhor, desfolhadas, estorricadas. E nunquinha que vai se sensibilizar com o fato de essas formigas serem obreiras – estéreis! - que levam alimento ao berçário do formigueiro. E mais: que ajudam a arejar o solo; que são exemplo de sociedade cooperativa; que são personagens de fábulas e histórias infantis; que... Sei não, mas é uma questão de horas para elas serem envenenadas. Ou queimadas com água quente. Me dá uma tristeza! Por que essa vizinha, em vez de rosas, não planta cravos, que são repulsivos às formigas?

A trilha fica congestionada. Formigas sustentam as fases verdes da lua; algumas só ficam no vai e vem, esbarrando nas outras. Até aqui há operários que só atrapalham? Ou terão uma função que desconheço? Os daqui e os de lá? Uma formiga se separa do grupo. Depois de dez centímetros de andança, encontra outra, que vem da direção contrária e parece ser da mesma espécie. Mas não tenho certeza. Tocam-se nas antenas articuladas. Blá, blá, blá! De repente, cada uma retorna pelo caminho de onde veio.

Fico angustiada, com uma formiga atrás da orelha.

Que química terão trocado? Que segredo? Que fofoca?

Ah, queria tanto falar formiguês!

terça-feira, 3 de maio de 2011

MÃES - Maria Helena Balen

Frases retiradas de textos dos apenados da PICS, Penitenciária Industrial de Caxias do Sul:

“Mãe é a pessoa que nunca deixa de acreditar em nós. Desde que o filho nasce ela imagina o futuro dele, mas nem sempre acontece como ela espera. Eu cresci e infelizmente fui pro caminho errado. Na rua eu tinha mulheres, amigos, mas quando vim preso só ela vem me visitar.”

“Ah, mãe, quantas vezes você me alimentou, me vestiu, me fez parar de chorar no seu colo! Quantas vezes você me deu conselhos, broncas, xingava quando precisava! Mãe, perdão por te fazer sofrer tanto.”

“Nunca poderei retribuir tudo que ela fez por nossa família. Mãe, você é demais!”

“Minha mãe teve oito filhos. Nós éramos pobres e ela fazia chapéu de palha de butiá e peneira de taquara para sustentar os filhos. Que saudade sinto dela!”

“Minha mãe pra mim é tudo. Ela sempre falava pra mim não fazer isso e eu ia lá e fazia. Por isso estou nesse lugar, mas eu prometi pra ela que vou mudar. Ah, eu estou preso desde os 16 anos: dois anos na FEBEM e um ano aqui.”

“Mãe não é só aquela que dá à luz. A minha avó é a minha mãe. Ela me criou e me deu amor. Vó, peço perdão por não ouvir seus conselhos Você sempre será minha mãe que eu tanto amo.”

“Mãe, neste lugar sofro por mim e por tê-la feito sofrer.”

“Dia das mães que sofrem por seu filho morto por alguém que ela nem conhecia e das mães que sofrem por ter seu filho preso. Qual é mais infeliz?”

Frases retiradas de textos de alunos do Colégio Mutirão Objetivo:

“Mãe, tu és única. Em teu olhar vejo várias em ti, mas em todas elas sinto o mesmo amor que sentimos uma pela outra.”

“Minha mãe é mais que mãe, é minha amiga, minha irmã.”

“Comparo o amor de mãe com uma bomba atômica que todos os dias detona uma explosão de amor”.

“A criança que perde a mãe fica com o mundo cinza, depois de um tempo a cor volta, mas sem brilho”.

O amor dos filhos para as mães é transcendental. Está presente em colégios, atrás das grades de uma prisão, em qualquer lugar do mundo.

A todas elas, um Feliz Dia das Mães.

maria.balen@pioneiro.com

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Nada? Que nada! - Ângela Broilo

O mundo do nada não existe. Pelo menos se você está vivo. Até mesmo a meditação alguns diziam: é pensar em nada. Como foi bom conhecer o pouco que aprendi sobre o assunto para saber que isso não tem fundamento.

Um livro que me deixou extasiada na tentativa de apresentar a não existência foi Malone morre, de Samuel Beckett. Sugiro a leitura quando você estiver de bem com a vida, porque, apesar de ser uma das obras mais extraordinárias e verossímeis que li, ela anda em estado permanente de depressão.

O artista travado. Quem disse isso? Hoje estou meio travado? Na verdade, não é o fato de que ele não tem nada para pintar, esculpir, escrever... Ele acordou exigente demais. Logo deve pintar uma das melhores obras de sua vida. Quem sabe?

Eu que não tenho obrigação nenhuma, mas gosto de brincar com as palavras. Acho o máximo quando os contos caem no colo. Vou anotando e guardando em uma pastinha para a hora que der vontade de escrever. Não existe o mundo do nada. Sempre tem algo no horizonte, nem que seja a própria morte.

Nos anos noventa, eu pensava em móveis brancos, uma casa nua de objetos. Hoje tenho meus móveis todos brancos - aquele branco sujo claro, não o brancorroroso - mas tenho objetos que compramos juntos, ganhamos, adoramos. Cada um deles têm sua história. Daria um livro.

Do nada, o mundo não existe. Eu ainda não decidi se quero ser cremada ou enterrada. Se for enterrada, seria menos egoísta. Serviria de refeição para um monte de seres vivos. Enfim. Enquanto estivermos vivos, tudo é uma possibilidade. O nada só vem depois. Enquanto isso, vamos aproveitar tudo. Se você não lembra de onde veio aquele objeto, tire da sua estante branca, deixe lá só os que têm história para contar. Ou vá pelo mais difícil: invente!

domingo, 1 de maio de 2011

Quem quer ser síndico? - Ângela Broilo


Acabei de ler mais uma vez O Caso Exploradores da Cavernas. Para quem não leu, um resuminho: os homens tiram no dado quem vai morrer para alimentar os companheiros. Bom, canibalismo à parte, fiquei imaginando, após a reunião de condomínio em que sugeriu-se tirar o síndico no papelzinho, se não era o mesmo caso. Ninguém queria morrer síndico esse ano. A reunião foi adiada. Pena... não tem ninguém que eu antipatize, senão votava para síndico. Bom, aí seria pior ainda. É o chamado tiro no pé.
Mas não era esse o assunto. O que eu estava pensando mesmo era o que aconteceria no caso de um cataclisma descomunal na cidade, de modo a ficarmos todos presos dentro do prédio. Sem comunicação, tevê, Internet, sem nada. Passa mês, passa, passa mais, acaba até a água, como ocorreu com os exploradores de caverna. A galera mais magra que modelo da Givenchy.
Ocorre o mesmo caso dos exploradores. A única forma de sobreviver: canibalismo. Claro que os desencachorrados , já de olho há tempo nos animais do prédio, argumentaram:
- Primeiro os cachorros. Imagine matar gente quando tem mais de um cachorro por andar.
Aí a Ju e eu conseguimos nossa primeira inimiga:
- Primeiro o gato. Só tem um gato. – ela lembrou.
E eu:
- Todo mundo faz churrasco de gato na rua e fica muito bom. Lembra do cheirinho, gente.
A injustiçada dona do gato foi a primeira vítima. Um gato magrinho que só vendo. Comemos o gatinho com todo respeito que a fome permitia.
Antes que fosse discutir a matança dos cachorros, fomos soltos.
Só de culpa, eu e a Ju aceitamos ser síndicas. Toda manhã encontramos riscos novos no carro. Nem reclamamos. Nem que fosse verdade.

Acho melhor ficar longe do Panazzalo por uns tempos. Sabe-se lá. Tem amiga que adorava cachorro. De repente, virou adoradora de gato. Nada contra, mas vai saber!