sexta-feira, 18 de novembro de 2011

A sinfonia de viver demais!, de Ângela Broilo


Eu adoro cachorros pela ligação de afeto incondicional. Pessoas inteligentes pela conversa deliciosa. E tem gente que gosto também, gente como a gente assim, não tão genial, mas que combina para conviver como se tocasse a mesma música. Não é difícil explicar. Todos convivem assim. São pessoas que vão aparecendo pela vida e você vai percebendo que juntos compõem a mesma sinfonia. E assim a vida passa e passa e passam anos, você nem percebe, já leu Proust, fez aula com o Donaldo e leu Ulisses, o cachorro está respondendo suas perguntas mais profundas, entende o marido por telepatia, fica triste quando uma amiga pede divórcio como se a sua vida é que estivesse desmoronando. Quando percebe, está lendo a tradução do Bezerra do Dostoiévski embevecida, ao mesmo tempo em que lê um romance infanto-juvenil num encanto aristotélico.
Você influencia e é influenciada. Conhece pessoas que cometem cada um dos sete pecados capitais. Se for escritor, ator, poeta, fica babando para estudar cada gesto dos “personagens”. Não demora, percebe que se encontra entre elas. Horrorizado decide quer virar budista, umbandista, fazer Yôga, Yóga, retiro espiritual, jejum... Percebe que gosta mesmo de ser você, fazendo terapia e essa é sua meditação semanal. Passa a aceitar as próprias imperfeições. Lida com as crises da família, do cachorro, da empregada, percebe, eventualmente, que a crise é sua e não do mundo inteiro. Aprende que o melhor caminho é dar risada. Assim todos abraçam você num aconchego delicioso porque rir é um presente melhor que jóia.
Aprende que é bom valorizar o agora. Tudo que tem agora. Porque nada dura para sempre. O que tem hoje, se possível de causar bem estar, aproveite.
Marido mal-humorado. Você se entristece com a crise dele. Mas sabe que vai passar. Lembra que vai passar porque todo fim de ano ele fica mal-humorado. Bom lembrar. Então você pensa naquele sorriso aconchegante que te conquistou no comecinho da relação e torce para que possam ter muitos finais de ano com mal-humor. Ri amarelo. Mas lembra que o interessante é rir com todas as cores possíveis porque você não está de mal-humor e não é uma mulher chatinha de filme gringo. Tanta coisa boa para fazer na vida. Uma pessoa tem direito ao seu humor, afinal de contas. Liberdade é isso. Respeitar a individualidade do mal-humor alheio. Amar na saúde e na doença, no bom-humor e no mau-humor.
Só não preciso me sacrificar e ficar por perto. Chamo a cachorra que está sempre feliz e vou visitar minha avó de quase noventa anos, que está sempre naquele estado glorioso de bem estar. Ah! Isso que é sabedoria de viver! Quero muito ficar velha, velha, velha e ser como minha avó! Ela diz: eu olho no espelho e não sou eu que estou lá, é uma velhinha! Chego a conclusão que os espelhos são traiçoeiros e muito mentirosos! Deveriam ser processados por dano moral.  

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