sexta-feira, 15 de abril de 2011

Acordo Conjugal - Ângela Broilo

Faz um tempo eu estava trocando a noite pelo dia. Fazendo tudo à noite, dormindo durante o dia. Não nego. É muito gostoso isso. Mas o marido deu um ultimatum. Ruim para tua saúde, chego em casa tu tá dormindo, assim não dá. E ainda: tu parou de fazer exercício. Receita médica pra você. Depois tu enlouquece, não quero ter que lidar com mulher maluca e por aí foi. Ele tem razão. Estou me esforçcando para dormir cedo e acordar cedo. Academia de manhã. É bem complicado. Acordo no meio da noite o tempo inteiro. Fico parecendo um zumbi. Acho que vou precisar de algumas semanas para acostumar.
O que a gente não faz por amor? Mas um amor bonito, preocupado com a saúde do ser amado. É bonito isso. Difícil fazer. Mas de outra forma estava fazendo mal para mim mesma e para meu marido. Vale um esforço agora. Por saúde, por amor, pela tranqüilidade da pessoa amada.

Saudade das Pereiras - Liane Rech

Seis Elas Contam


Já de manhã, quando abro as janelas, sou privilegiada pela natureza, porque a paisagem, que se descortina diante de mim, é um presente divino. Depois do longo inverno cinza e gelado, estava com saudades de olhar para fora e ver esse cenário. Todo verde. Meus olhos se deleitam. São quatro terrenos que se estendem aos fundos das moradias vizinhas que, de onde estou, os vejo como se fossem um único e extenso jardim repleto de árvores frutíferas, flores, folhas, folhagens e mais um enorme pinheiro, pinheiro esse que acompanhei seu crescimento desde sua plantação. Hoje em dia ver esses “quintais”, em pleno centro da cidade, é uma raridade. Esse cenário é um alento, um carma à minha mente. Nesta época, os passarinhos fazem um show de canto e de vôo. É um querer mostrar-se mais do que o outro: exibir quem canta melhor. São os protagonistas da Primavera. Tenho que aproveitar este presente da natureza. Aproveitar... Antes que venha a mão do homem arrancar tudo e substituir a paisagem por uma muralha fria e sem vida. Isso já ocorreu, anos atrás, com duas pereiras que aí se encontravam. Não foram substituídas por uma selva de pedra, mas pelo vazio que ficou.


Nessa época, elas ficavam cobertas de flores brancas. Era um prazer olhar para as duas. Majestosas e imponentes pareciam ser as proprietárias do local. E quando chegava a época das frutas? A quantidade de peras que pendia de seus galhos mostrava o quanto reprodutoras eram. As vizinhas sempre me presenteavam com cestinhos fartos de peras. E que gostosas! Mas..., para desgosto meu e, com certeza, das proprietárias elas foram diagnosticadas como doentes e tiveram que ser cortadas. A sentença de morte foi decretada pelos fiscais da Secretaria do Meio Ambiente. Considerei um verdadeiro assassinato. Duvido que não houvesse remédios para tratá-las. Elas eram o recanto da passarada. A revoada soltava o gorjeio, e a sinfonia soava melodiosa! Até hoje, quando olho da janela, aquele vazio me incomoda e deixa saudades. Às vezes olho para as fotos que delas reproduzi, num domingo gelado de agosto. Foi quando, ao acordar e olhar para fora... Que surpresa! Estavam as duas branquinhas cobertas pela neve que caíra na madrugada. Era um verdadeiro postal de paisagem européia.